Exposição “Ver o peixe” abre nesta quinta, dia 23, no MArquE

20/10/2014 23:48

ver_opeixeOrganizada pelo Coletivo de Estudos em Ambientes, Percepções e Práticas (CANOA), a Exposição VER PEIXE apresenta imagens feitas em um contexto de pesquisa em andamento, sobre percepção ambiental, práticas e habilidades na paisagem litorânea. As imagens apresentadas pela exposição foram produzidas nos meses de maio, junho e julho de 2013 e 2014, nas Praias da Barra da Lagoa e Campeche, acompanhando três parelhas de pesca de cerco na praia: Saragaço, Atrevida e Glória. A exposição é o primeiro resultado de uma pesquisa voltada para a atualidade, o vigor e a importância da temporada da tainha nas praias de Florianópolis e as muitas habilidades e dinâmicas de relação com o ambiente marinho que ela devolve todos os anos à cidade.

23/10/2014 a 20/10/2014 – 9:00hs às 19:00hs
Abertura da Exposição: 23/10/2014 – 17:00hs
Sala Elizabeth Pavan Cascaes – Museu MArquE – UFSC
Campus  Universitário – Museu de Arqueologia e Etnologia Oswaldo Rodrigues Cabral – 3º andar – Trindade – Florianópolis – SC
  
A Atualidade da Pesca da Tainha nas praias de Florianópolis
A praia é um espaço entre a subida e a descida da maré. Movimento instável que envolve muitos agentes, promovendo permanências e transformações na paisagem litorânea. O litoral é parte da paisagem e ao mesmo tempo seu limite. Nas praias de Santa Catarina, como em todo o litoral sul do Brasil, há uma constância da presença de certos atores nos meses de maio a julho. Todos os anos é vivida a época da tainha, movimentando muitas temporalidades. As sutilezas que envolvem o conhecimento dessa época retornam nas formas de engajamento no ambiente marinho que praticam os camaradas da pesca. As tainhas são percebidas em movimento. É à corrida das tainhas que os pescadores estão atentos. Sua corrida envolve seu agrupamento em grandes coletivos, nas alternâncias entre as frias correntezas que vem do sul e aquilo que interrompe a corrida, a entrada das tainhas com as correntezas de norte e nordeste que as aproximam dos costões, praias e estuários.

 
A temporada de pesca, em suas muitas modalidades (embarcada, com cerco na praia, com tarrafa,…) se articula aos ciclos de alterações ambientais. A temporada da tainha também retoma a presença dos cardumes nas redes, nos barcos, nas peixarias, nas churrasqueiras, nas trocas entre fregueses, vizinhos, parentes. Se algumas modalidades longe da costa são mais eficazes em muitas toneladas de peixes capturados, outras mais perto de nós são mais eficazes na quantidade de pessoas que conseguem agregar. De todas estas práticas, é a pesca de cerco na beira da praia que marca o encontro da cidade com o mar. Acompanhando as parelhas de canoas bordadas, redes, camaradas, patrões e vigias é possível aprender um tipo de engajamento com o mar que redesenha o litoral da cidade.
 
Por várias praias é possível assistir ao espetáculo das redes sendo puxadas do mar por uma linha de braços que vão se agregando ao esforço de finalizar o lanço e ver circular os quinhões de peixes entre sócios, clientes, amigos e parentes. Imagens que se repetem marcando o amor da cidade pela tainha e o mar. Mas há outro tempo que antecede o ritmo vigoroso do lanço, pouco percebido pelos olhares mais desatentos. É a espera pelos cardumes, na qual os pescadores podem permanecer horas, dias desconfiando dos movimentos do mar, atentos aos sinais e maneiras das tainhas finalmente se mostrarem. Uma espera que se desfia nas conversas no barracão, nas remendadas de rede, nas partidas de caixeta e dominó, nas risadas e prazeres do convívio no rancho de pesca. Uma espera que disfarça outra prática fundamental da pesca, a observação dos ciclos de relação dinâmica entre chão, mar e céu; areia, água e vento; coletivos de gente, redes, canoas e peixes. Quem passa na praia e não conhece esta espera, pode até não entender porque a areia e o mar precisam estar assim, calmos, sem barulhos e agitos que possam assustar os peixes. Pois estão todos sob estado de discreta atenção, concentrados em ver peixe.
 
Ver Peixe
 
Durante a temporada da tainha em Florianópolis, como em todo o litoral sul e sudeste brasileiro, lá estão os vigias da pesca de cerco de praia, voltados para o mar, em barracos, palanques ou caminhando na praia, sobre dunas, pedras e encostas de morros, diariamente, das primeiras às últimas luzes do dia, faça chuva ou sol.
Discretamente distribuídos ao longo da costa, os vigias observam o mar atentos à chegada dos cardumes, estimando a quantidade de peixes, a direção e a velocidade em que seguem, orientando seus camaradas de pesca sobre a velocidade e o trajeto a percorrer com a canoa, a disposição da rede a ser lançada ao mar e puxada na praia.
Da habilidade do vigia pode depender a diferença entre matar, em um único lanço com a rede, magotes com algumas dezenas de tainhas ou grandes mantas com centenas ou milhares delas.
Não basta enxergar bem. Para ver peixe é preciso desvendar o ambiente, perceber suas variações, ritmos e movimentos que indicam a presença das tainhas e os meios de cercá-las. Uma habilidade com a qual não se nasce, mas que também não se aprende simplesmente. Algo que se desenvolve com a experiência, a interação continuada com o ambiente e a prática da pesca, seja acompanhando os pescadores mais experientes na pesca ou na vigia, seja jogando tarrafa na beira da praia ou, ainda, trabalhando na pesca em alto-mar.
Sons, luzes e sombras, ventos e correntes marinhas, o comportamento de peixes diversos (anchovas, tainhas, manjubas), de botos, gaivotas,socóstrinta-réis e outros animais, o relevo do fundo do mar… É com base neles que o vigia decide para onde olhar na imensidão do mar à sua frente e por quais sinais buscar.
Ariscacansadabaetaovadafacão. As tainhas não são somente vistas, mas se mostram ao observador atento. Na beira da praia, correndo a onda. No vermelhão ou amarelo, sob a forma de manchas cujo tamanho e tonalidade informam o tamanho dos cardumes. Na aguada ou no arrepio, alterações na textura do mar produzidas pela agitação dos peixes. No pulo e na barrigada, quando produzem reflexos brancos e prateados na superfície da água ao se mover.
Nos momentos de espera, ver peixe é o que todos os camaradas da pesca praticam, para tomar a decisão de botar a canoa na água, lançar a rede, fazer o cerco, trazer para a praia, repartir os quinhões. Na companhia dos vigias, somos desafiados a ver de outra maneira – a olhar ao redor, varrer a costa panorâmica do mar com os olhos e ouvidos, sentir na pele as mudanças no clima e situar-se em relação a tudo que se move e refaz a paisagem litorânea. Pois é com a atenção dirigida que se pode ver o peixe quando ele se mostra… É algo dessa experiência que buscamos apresentar em fotografias panorâmicas e videos.
Pesquisa e Imagens:
Barra da Lagoa – Gabriel Coutinho Barbosa, Rafael Victorino Devos, Viviane Vedana
Campeche – Paulo Olivier Ramos Rodrigues, Victor Vieira Paulo
Expografia: Poliana Santana, Thainá Castro Costa Figueiredo Lopes
Realização:
CANOA – Coletivo de Estudos em Ambientes, Percepções e Práticas
Apoio:
PPGAS – UFSC / Instituto Brasil Plural / MArquE – UFSC / SECULT – UFSC / CFH – UFSC